sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

O Ciclo da Esperança



o, não é o Natal um rito sem sentido,
é uma síntese ritualística do que vivemos
todos os dias... É a busca da força e a
renovação da fé na espécie humana...

É reforçar a embarcação dos sonhos
para cruzar os mares desta vida, 
é o içar das velas do pensamento
para ir além das lutas, dos medos...

É seguir adiante apesar dos monstros
que habitam nossas noites e corroem
a estrutura das nossas lidas, e sopram
as velas na nossa jornada pelos dias...

É o renascer sazonal da luz que nos habita
e que ao longo do ciclo oscila, por vezes
se apaga, ou tremeluzindo de medo pede
a nossa ajuda para seguir nossa trilha

O Natal é o encontro de todas as luzes
de dentro, com todos os sonhos do alto
que apaga todas os reveses da diferença
para exaltar as orações do silêncio...

sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Vendavais Comuns


O vento das circunstâncias
corrói memórias e alianças,
transforma em pó
as mais íntimas lembranças,
e fatia em duas partes
qualquer íntimo afeto.

De um lado ficam
saudade e esperança,
e do outro, por caminhos
de silêncios, prados
e mais prados 
de esquecimento...

segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Lembrança



Agora os trovões rosnam lá fora,
mas sei que tu ouvirias cavalos de fogo
a percorrer em fúria o céu noturno,
e cantarias os cânticos da chuva
e o ritmo do vento...
E as cores da noite, com os matizes
do silêncio, coloririam o teu poema...

Mas tu não estás, e teu canto agora
está dentro da noite, e no coração
da terra, junto da minha saudade...

sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Viagens...



Outra vez, e outra vez
os barqueiros  da noite
vêm remando e agitando
com seus remos
as águas turvas
do meu pensamento,
onde ponho
estrelas de versos
à dirigir-me firmemente 
ao oriente de mim mesmo...

Destino de mares escuros
onde habitam todos os
mistérios do mundo,
que são remexidos 
pelas teorias das gentes,
em suas buscas por verdades
urdidas com tramas de medo,
pois que nesse mundo vazio
todos os segredos têm
de ser desacreditados
para sustentar
inúteis sentidos...

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Criadouro


Alimento todo dia, 
na pequena gaiola do meu peito,
um coração faminto de versos, 
de sonhos e poesia,
sedento de chuvas e de ventanias...
Um coração de presságios e profecias,
que eu por vezes, cheio de travessura,
deixo escapar da gaiola segura,
para se aventurar no universo das ruas...

terça-feira, 11 de outubro de 2016

A Cidade dos Bruxos


A pequena cidade dos bruxos,
tem luares sobre abóboras,
vassouras voadoras dormindo
ao lado das portas...
Gatos pretos esgueirando-se 
pelos sabás...
Tem oráculos de fumaça e fogo,
e segredos revelados
nas palmas das mãos,
e na face dos arcanos...

E nos canteiros, ervas encantadas
de veneno e cura,
e água pura que borbulha
à espera de chás bebidos
em conversas sobre o oculto,
ou em fofoca sobre os vizinhos

Na cidade dos bruxos
tudo transcorre quase quase
como no resto do mundo todo,
com a diferença de que
não há susto no que nos outros
causa muito medo...

Na cidade dos bruxos
tudo é pleno de sentidos,
e se conversa em sonhos
com os entes queridos,
que nunca são esquecidos,
e se fala com aves e flores,
e as árvores ensinam coisas
sussurradas aos ventos...

Na cidade dos bruxos
se conversa com o silêncio,
e os idosos e as crianças
são chamados de sábios...

sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Âncora



Fui espiar a cara da lua
- Hoje maior do que nunca nos céus...!

Estava linda! Medalhão de prata
com aréolas irisadas,
um sol opaco resplandecendo
na madrugada,
um espelho de sonhos...

E meu espírito abriu asas
em sua direção,
e voltei, como sei que fiz antes,
em sonhos, em versos, em ritos atávicos...

Voei à minha casa lunar
com salões de nácar
e brisas de tule acinzentado...

Mas, uma vez lá, estranhamente,
tudo me remeteu à minha casa terráquea,
onde sonhos de beleza, amor e verdade
abrem rios de sangue no chão,
neste mesmo chão
de onde brota nossa estúpida humanidade.

Travessia Noturna


Atravesso a imensidão da noite
com minha embarcação de sonhos.

E as minhas velas estreladas,
amarradas às nuvens azuis da madrugada,
vão recortando o longe,
vão desenhando o perto...

E cruzo o imenso
oceano dos homens
que de fé, poesia, amor e risos
é quase um deserto!

terça-feira, 30 de agosto de 2016

A Árvore da Paz...


Minha infância dorme à sombra 
de uma imensa árvore de copa ampla
que enchia de flores amarelas na primavera, 
e pingava sementes dentro de vagens
que pareciam gotas despencando dos galhos, 
mas desciam girando feito helicópteros
que eu, minha irmã e vizinhos, brincávamos 
numa disputa pra ver quem conseguia apará-los
sem deixar cair no chão... O Vencedor colhia as sementes, 
brincava com elas, e depois as devolvia ao chão... 
Assim éramos todos, sem saber, 
disseminadores do gigante
que nos acolhia em seus galhos, 
e nos dava assento em suas raízes enormes...

Sucumbiu ao progresso; um terreno enorme e vazio 
atraía a cobiça dos edifícios e de seus construtores. 
O gigante calado nos viu comprar sua briga, defender sua vida,
abraçar seu tronco em protesto... Mas vieram os homens da lei, 
que nunca estiveram ao lado da beleza e da harmonia, 
e cortaram em pedaços o gigante... Dias antes,
numa ventania, ele fez gemer alto suas folhas 
e seu tronco, sabia que ia morrer!
Mas gritar a quem? Implorar por quem? 
Às crianças que corriam à sua volta?
Aos velhos que sentavam à sua sombra? 
Nem tinha flores nesse dia... Só tristeza!

Mas não importa! Ainda em algum lugar em mim 
ele viceja com sua copa verdejante,
com suas flores amarelas e seus helicópteros de alegria, 
que trazem na barriga as sementes do descanso 
que hoje vai longe, naqueles dias sem pressa, 
naquele tempo em que o tempo
parecia nos conduzir à eternidade de dias iguais 
em leveza, prazer e sonhos bons...
Descobri mais tarde que o gigante se chamava guapuruvu... 
Que significa "madeira podre" em guarani... Mas tomei a decisão 
de que significa para mim, e para sempre, "madeira da paz",
onde estou deitado à sombra de suas flores até hoje,
escrevendo versos que abrem asas ao infinito...

quinta-feira, 21 de julho de 2016

A Construção das Coisas...



Que não nos vençam esses caminhos 
crivados de dor e ausências, esvaziados
de abraços, lembranças e sonhos
e de memórias ancestrais... 
De risos por nada, de gentilezas
simplesmente esparramadas
para o outro, sobre o outro,
de muito amor dado de graça...

Mas tais caminhos de amor
nunca foram trilhados, foram só sonhados
(eu sei que vós todos me direis),
tu és poeta e não sabes de nada!
Tais coisas nunca houveram, nem haverão...
Tudo o que temos é o que sonham
os outros que anseiam esses sonhos...
Mas como são loucos, nunca os seguirão...
São bonitos e loucos, mas são tão poucos
os que sonham tais sonhos que nos resta
chamar de loucos esses que assim como tu
anseiam tais coisas, tão simples e puras,
mas que nunca existiram, nem existirão...

Mas enfim, faz parte de mim, e dessa sina
de escrever sonhando o que anseia
essa voz íntima, que toca as outras vozes
secretas que habitam os outros corações
que, apesar de empedernidos, se enlevam 
e suspiram baixinho comigo ao lerem 
meus versos... A esses dedico o meu
sagrado ofício de desenhar os caminhos
que os sonhadores do futuro realizarão!

terça-feira, 24 de maio de 2016

Aquário


As lágrimas da noite embaçam a vidraça
e criam um mundo turvo e paralelo...

De repente estou num estranho mundo-aquário
onde tudo é vago, nebuloso e solitário...

Onde divago com meus sonhos de corsário
e de errante pelas vagas da noite rumorosa

Caçando os sentidos com meus versos
guiados pelo clarão da lua imaginária...

Enquanto a lua real treme de frio lá fora
enrolada, em vão, nos lençóis da neblina...

quarta-feira, 27 de abril de 2016

Sobre Poesia e Poema


À Vania de Oliveira

Um racionalista dirá que a poesia é a matéria, e o poema o produto... Como poeta lhe direi que a poesia é a árvore, e o poema o fruto!

quarta-feira, 20 de abril de 2016

A Casa Poética



Fiz da poesia minha casa,
construída de tijolos firmes
de sonhos deste mundo,
e de outros mundos também...

Estendi lençóis de música
alva e tênue, de rimas discretas,
para aconchegar os olhos
que pousassem sobre meus
versos (aéreos e fluidos)...!

Abri canteiros de terra fértil
onde qualquer sorriso poderia
florir em profusão, e subir
aos céus do pensamento
dos que amassem 
amar meus versos
de todo o coração...

Construí minha casa na poesia
para que meus mortos tivessem 
onde morar, e seguir sonhando
coisas deste e de outros mundos,
e onde eu pudesse abraçar 
os amigos novos e esquecidos
num abraço de uma vez só!

sexta-feira, 8 de abril de 2016

Canção das Searas



Cai, pétala, lágrima, folha levada ao vento,
cai um pouco do tempo a cada noite que cai
e a cada sol que levanta... Anda, tua história
não se faz no chão da inércia, nem dentro dos 
braços mais doces e amorosos... Tua história
tá lá fora, nos sussurros das sombras, no aço
da vida, nos uivos da matilha e tudo o mais
que se faça não vale é nada...! 

O que não nos custa o sangue e não nos verte
lágrima, não constrói nada. O que não nos faz
respirar mais fundo e forte, e nos rouba um tanto
do sono e da noite, e nos faz não temer a morte...
Bem, isso passará e tu passarás também, sem teres
contado ao mundo uma única nota, sílaba, canção
ou verso sobre o que vieste fazer aqui e sobre 
o sentido de teres existido na existência de outros...

quarta-feira, 23 de março de 2016

Precipitação



Então a poesia é isso,
uma pétala que despenca
de uma altura imensurável
e desconhecida,
e me ilumina,
e me refresca
como chuva cristalina,
e verte dos meus dedos
como perfume
em gotas... Em letras
que viram de novo pétalas
que atiro a quem me lê...

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Alento



In Memoriam à minha mãe, Hélia.


Enchi de delicadeza cada verso, e cada palavra
nos bilhetes que deixei à tua porta antes de partir,
tomado de esperança última e de inútil espera
(fervorosa de sonhos)... Porque estavas morta!
E nenhuma poesia, súplica ou lágrimas te trariam de volta...
Mas nas asas dos meus sonhos ainda voas comigo,
e nas varandas da minha poesia sorrimos, e abraçados
ainda somos mãe e filho, porque existe dentro de nós
algo que a morte espezinha mas não destrói, e assim
tive forças para viver o resto dos meus dias e todas
as agonias e perdas que a vida ainda me reservaria...

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Incidente Poético



Desabotoaram-se todas as luzes do céu,
e o dourado e o azul abriram-se na minha mão
e da minha mão pra caneta, e da caneta pro mundo...!
Afim de que o tempo não varra pro fundo
do esquecimento um dia assim...

Na verdade eu tenho é medo
de que o infinito de cada momento
se perca, pra sempre, de mim...

Vigílias

As portas abertas estão sempre à espera de algo... Deixo minha porta da cozinha sempre aberta à luz do dia, ao vento furtivo, à visita d...