Ela tomou coragem, vestiu casaco
e botas e foi enfrentar a chuva. Pegou sombrinha e se foi rua a fora naquele
fim de tarde frio de sábado. Dirigiu-se à casa da velha, a luz da sala estava
acesa. Subiu a escadaria e tocou a campainha. Abriu a velhinha miúda, frágil,
de olhar manso...
- A senhora faz uma poção pra
mim?
- Oi filha, tomou coragem é? –
Disse a velha Abigail com um sorriso maroto.
- Pois é! – Disse a mulher meio
constrangida.
Sentando na poltrona castanha em
que assistia tevê dirigiu-se à sua visita inesperada que se arranjou pelo sofá,
e disse:
- Preciso te avisar de três
coisas muito importantes... A primeira delas é que pode não acontecer nada. Ao
contrário do que se pensa o amor não é pra todo mundo. Tem pessoas que tem essa
sina de ficarem sós pela vida, ou de nunca encontrar uma parceria amorosa de
verdade... – A mulher engoliu em seco – A segunda coisa é que é bem provável
que não saia como você sonha... Pode não ser o homem dos seus sonhos, ter os
braços, olhos e boca que deseja, mas ainda assim será um amor... O seu AMOR
entendeu? – Ela acenou a cabeça como uma criança atônita – E por fim – Completou
a velha e doce Abigail, eu não sei quanto tempo levará! Esse encontro faz parte
de um ciclo maior que foge à minha compreensão, eu só sei juntar os elementos
que poderão magnetizá-lo até você se for o seu destino... Entendeu minha filha?
– Ela acenou a cabeça positivamente, mas estava visivelmente tensa!
- Mas a senhora não sabe me dizer
se o amor está ou não no meu caminho? – Perguntou timidamente, com um nó na
garganta.
Minha filha me perguntam isso com
tanta frequência que criei um quarto aviso, mas como ele é recente e eu velha,
acabo me esquecendo. Pois bem, o quarto aviso é: sou uma bruxa e nem todas as
bruxas sabem do futuro ou leem oráculos. Ganhamos um único dom, as bruxas de
mentira que você procurou é que dizem fazer uma porção de coisas. Elas nada
sabem de magia de verdade. Todas nascemos com um só dom, nascer com ele é um
presente, descobri-lo é uma segunda dádiva, e focar nele por muito tempo é que
te faz uma Mestra... O meu dom é o de
atrair o amor, para os que tem ele no caminho, mas que se afastam dele por
algum motivo.
A mulher estava de novo
petrificada, achando que não entendeu direito tudo aquilo, mas se calou.
- Bom – Disse Abigail – Agora
presta atenção em tudo o que vou precisar...
E veio uma lista de coisas
estranhas, ervas secas, frutas frescas, penas brancas obtidas sem o sofrimento do
animal, e isso tudo até a véspera da próxima lua cheia. Ela correu, e quando
chegou o dia tudo foi meio constrangedor, teve de dormir nua à luz do luar,
depois que a velha passou um óleo de odor doce e amadeirado no corpo dela,
enquanto entoava um tipo de prece...
Quatro longos meses se passaram
e, de repente, aos olhos da mulher o Bruno, o do bairro, saltou aos olhos... O
Bruno? – Se indagava ela – Ele tinha quarenta e poucos anos e só usava bermuda
e chinelo e, no máximo, com muito frio, moletom e tênis! Boca grande demais,
olhos pequenos, nariz largo... Não parecia inteligente. Com o tempo, porém, o
Bruno ia ficando mais e mais interessante. Detalhes que se revelavam, braços
fortes com mãos grandes e firmes, sorriso fácil. Acolhia animais pelos
caminhos. Quando deu por si estavam rindo juntos, ele se apresentou aos gatos
dela, cozinhou pra ela. Descobriu que ele morou no exterior, e que era bem mais
interessante sem suas roupas. Gostava de ficar debaixo das cobertas no inverno,
de cozinhar, e de passeios na praia no verão. Tudo foi muito rápido, intenso...
Um dia entrando no carro ela viu a Abigail lá na sua porta, a velha deu de
ombros num sorriso meigo e maroto do tipo: “Pois é!”, a mulher antes de entrar
no carro imitou o gesto, revirando os olhos pra cima como quem diz: “Nunca fui
tão feliz!”... E partiu!